segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Um

Sem sono, tela branca, três e pouco da manha. Quase quatro. Em um o pensamento voa, longe, pro nada. Pois um é o suficiente para ranger cansaços e chorar. Para isso, realmente, basta-se um.
Um é a visão atordoante de si mesmo, depois de longo tempo. Pois um também, na calada do sem-sono, vai verificar o que acontece por que afinal não anda...
Um deixado de lado, e sempre sozinho, vai tentando, desesperado, ainda ser um decente.
Pois para rolar pensando, basta-se um. E arrumar algo, por no lugar, também não se tem outro.
De um em um, o sono não enche o papo. E mais um não é coelho algum, nem carneiro para se contar.
De uma preocupação, vira um choro, uma prece. É um. Noite de um.
Mas os chinelos, os travesseiros e os óculos ainda são dois.

Dois.

Janelas grandes , sempre mostram dois. Caminhos e bancos também. Dois se abraçam. Dois levam. Outros dois discutem. Adiante outros dois, bestamente olhando o céu, se admiram refletidos na lua.
Com duas casquinhas , de diferentes sabores, em diferentes mãos, derretem-se no sereno da noite. Estrelas com testemunhas. Caminham pingando, levando como se tivessem coleiras, outros dois conversando distraidamente.
A noite, também se encerra com o dia. E mais outros dois.
Duas estrelas brincam alegres com a lua. E dois cachorros, na canção tocada do trotar de suas patas, rondam a praça de onde vagabundam todo o dia. Uma eminência de perigo constante. Perigo pra ninguém.
Um Ônibus deixa dois velhinhos no ponto de pedra-portuguesa. Duas sacolas nas mãos de uma senhora.
E dois, em par, de sapatos caminham sofregamente para casa. Por fim dois travesseiros acolhem uma cabeça cansada. E na janela o vidro é em dois.

domingo, 21 de setembro de 2008

Três

Três pessoas se estendem numa sala pequena. Amarela, mostrada, e três sofás também O som da rua se bate nas paredes mostardas e sem pão; ecoa o ciscar de rodas pelo piso branco, recém varrido. Piso de sala afinal.
Três pessoas, de diferentes pontos , numa mesma sala... Bem assim...
Que num vestido quadriculado olha absorta noite a fora. E outra bocejando, tecla seu amor ao amor distante. Bem atencioso. Atenção a ambos O mais tonto escreve, rabiscando a descrição.
Três pessoas numa sala pequena. Na mesma sala, mas os lugares são diferentes no coração.

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Uma Carta Aberta

E vai aquem interessar possa

No burburinho de pouca gente na praça, a caneta corre solta, feliz. Felicíssima.Pois andou meses atarefada com conversa séria, doida por uma parolagem fácil e feliz com o papel nas linhas como compasso, de pura bestice embromativa, bem próprio de caneta que súbito se desocupa.
Pois esta é uma carta aberta. Aberta a todos, a quem aqui passar. E mais ainda de sentido. Pois o tempo me foi minguando bem assim... E me vi necessitado de linhas bestas e puras, sobre tudo felizes. Indo ao sabor dos carros corridos no fim de noite, fim de inverno e banco de praça à meia luz, que ainda não está no fim; graças a Deus.
Me venho passando bem nos ônibus, em rilhar dos trilhos; correndo e voltando sem correr, para um relógio que me perde de vista. Cochilo sentado. Ronco em pé.
To cansado: tenha dó!
È uma carta. Ainda continua sê-lo, mas sem muitas notícias plenamente fundamentadas. Só noticiosas. Falácia solta em linhas amiúde. E não foi? A lua de ontem estava lá toda prosa... Ria , brilhante. Linda!Festejava nada com duas estrelinhas sem-vergonha que lhe saltavam em redor. Borbulhavam límpidas no céu.
Grande notícia para uma carta.
E aí vão mais grandes notícias para uma carta.
Minha cidade, não muito preferida, mas ainda minha, continua enxada. Desordeira e inchando, vai ficando até sem lado para se espichar na sua constante inchadura.
E que festa! Sim senhor! Comemoram não sei o que, e não sei com que tempo. Sempre cheirando à churrasco e cerveja, as ondas e satélites repetem o comum do futebol burramente ampliado a escalas absurdas. Bola flatulenta também se vale de menção honrosa e reportagem.
Exagero é não gostar (dizem)!
E num ritmo frenético as coisas se arrastam. Marcha lenta para a grande minhoca-engarrafativa. Vai tomando tudo. E então a melhor opção de exercício matutino é o estirar-se lento e cumprido da metálica e carbônica minhoca-garrafa. Que se vai gritando pela avenida a fora de muita gente, uma minhoca-metálica gigante de voz buzinante.
Suores escorrem lentos como o dia. É inverno... Mas isso não acontece tanto. Só de vez em quando. . Um inverno seco, e quando chove, se cai pouco. Não tenho muito, afinal, para falar sobre isso.
Segue prosa.
Escorre carta.
Dança letra.
A caneta reza a sua ladainha. Reza em “i”.
Lá vai o rádio vomitando absurdos, num ritmo agitado, morno e néscio.
Coisa memorável de se notar: poucos cães, vagabundos sem pátria, vagam hoje na cidade.
Casais dançam imóveis numa dança burlesca sobre os bancos, frestas e escuros. Sem sair se cansam de lugar e vão-se embora, de mãos dadas. Ofegam sei lá por que (ou sei e me finjo de puritano; pura besteira)...
E por aqui vou ficando
E muito mais me “cartando”
Uma carta aberta
Carta absurda. Endereçada a quem interessar possa. Termina dizendo notícias de nada , numa cidade caótica. De ritmo besta, morta-de-chique, e de tanto sentido quanto esta carta .

Com'amor e sarcasmo
Caio Bessa

terça-feira, 3 de junho de 2008

" A marcha (primeira parte)"-É se ver de maneira amorosa, para assim ver os outros...

o Sol vai se deitando leitoso e vermelho por de trás dos prédios naquela tardinha quente e populosa de verão , tão típico do centro da cidade do Rio de Janeiro. Os prédios parados , e lá do alto assistindo as pessoas apressadas e ônibus apinhados , desesperados pela volta e o descanso do dia, aguardando que o túnel de retenção ao longo de seus caminhos se desfaçam. Sol vai se pondo, água, frituras e cosias estendidas pelo chão. Carros que se vão de um lado a outro num zigui-zague burburento . Nosso conhecido está ali, parado tomando uma água, e o chão o leva vagaroso até a Central do Brasil. Uma mochila vai nas costas, animada, para cima e para baixo, de um lado pro outro, acompanhando calada e agitada nosso protagonista tímido, voltando para casa e se encontrar só de alguma forma. Do jeito que está agora.

Olha fortuitamente para a direita, e se volta para cima , um semáforo lhe olha, totalmente monocular, para lhe avisar quando ir , ou não ir. Enquanto o boneco verde de folha , no seu momento de brilho, anda parado reforçando a todos que devem continuar em suas solas de calçados a espetacular volta diária para casa. E o protagonista não se nega a ir nesse rio de gente, rumo a bilheteria, pegar seu cartãozinho, e seguir minhocosamente num trem até a estação de seu bairro.

Funcionário de cartório em seu ofício. Concurso puxadíssimo, disputadíssimo, conhecidíssimo por todo o Rio de Janeiro. Concurso que quase era uma aparição divina nos anais concursórios da cidade carioca. Pagavam e recebiam somas , e nosso protagonista tem a feliz sorte de novo , novinho, já trabalhar nestes meios há bem uns 3 anos.

Pois então; e pois bem também. Sentado , um banco simples lhe mostra uma janela que corre ao encontro de sua estação tão aguardada. Enquanto o trem minhoca pelos trilhos, as coisas, os prédios, as pessoas e o muro habitual, longe e alto, lhes vai passante com o meio reflexo de seu rosto pardo e mestiço. Um calmo típico. E sua mochila vai silenciosa , feito bicho de estimação, no colo, enquanto a janela lhe mostra essas coisas passantes. A célere corrida da janela lhe dizia também o problema de sua porta.

Era a dobradiça? Não, tanto a dobradiça, quanto a fechadura estavam em perfeitas condições. Mas sim, girar a chave e abrir a porta de uma moradia em escuro, silenciosa e sem ninguém. Faria então o que sempre faz para se resolver, nem trocaria a roupa, deixaria a mochila, e com um trocado na mão, vai para um bar ruidoso, e silencioso sorveria ali uma garrafa de cerveja.

Porém, leitores e leitoras, como autor, eu sou implicante demais, e Agildo, que é o nome do nosso personagem (desta vez tem nome, to sendo legal!), nesse momento, já vai se colocando para a melhor porta de saída. Sua estação está chegando. E Saiu de seu torpor contemplativo e captou umas conversas alheias, que sem querer, lhe mostrou um pouco dele mesmo também.

Claro que não vou, por respeito a outros que nada se hão com esta narrativa , apenas pelo meu acaso, reproduzir a intimidade da conversa. Nem ao menos o dito trecho. Basta saber que Agildo se ouviu ali, um dependente de álcool para suportar a solidão. E outra coisa que também mexeu muito foi ouvi-las afirmando, e categoricamente, que o pior inimigo de hoje é nossa própria teimosia.

Que lhe foi uma bigorna que lhe pesou mais além do peso da mochila. Que alias ia balançando sem se importar, contentíssima balançante, com o pesar de seu portador.

Sentiu que precisa ... Precisava e não se sabia de que. Andava, e quase chegando em casa, via a sua sombra que se misturava ao som da palavra inimigo na sua mente.

E ficou pensando, que realmente , ele estava, naqueles dias de sua vida, sendo seu próprio inimigo. Inimigo? Mas como eu me destruo? E ficou ali se perguntando, sem resposta.

Abriu a porta, e a resposta estava ali, calada. Nem te ligo!

Respirou, entrou pela sala, tirou a mochila,e ela se aninhou num canto. Ouvia o som do sapato, que o irritou imenso, e de chofre se foi tirando com arrancar de meias. Desesperado, foi ao espelho. Queria saber se era mesmo seu próprio inimigo, porque via a vontade imensa de mudar. Pois imenso mesmo estava ficando o seu coração. Brotava-lhe um calor assim, pouco, e no espelho. Olho refletido no olho, se perguntou : “Eu sou meu próprio inimigo?”

Sua voz ecoou no vazio do banheiro. E nada, sem resposta. Pois então só de implicância , foi para o bar. E de chinelo, naquela noite meio quente foi. Mas estranho... Não queria beber.

Pediu. Sentou-se. O chegar do copo vazio com a garrafa já típica lhe mostrou. Era mesmo.

Então era mesmo seu próprio inimigo.

Inimigo de uma existência vazia, e se via egoísta sim. Nem fazia força para vencer sua timidez. Apenas na internete. Pagou, mas não bebeu. E correu, feito criança que compra um doce secretíssimo, e vai logo, loginho, para sorver esta maravilha escondida do açúcar industrializado. Correu para casa, e chorando, concluiu : sou egoísta. Preciso mudar.

Olhou-se de nov e se viu solitário. E sem saber como , e onde, lembrou-se das aulas de história que gostava tanto, e da célebre marcha do povo nos idos de sessenta e alguma coisa.

Se vendo então de uma forma mais sincera e mais amorosa, pensou nos outros como ele. Os que conhecia e que eventualmente não conhecia. Uma vontade louca de conhecer outros como ele .

È se ver de uma forma mais amorosa, para assim ver os outros...

E aquela vontade amorosa de mudar as cosias,uma paixão pulsante, nova e sincera pelas coisas , pela vida e pela noite e o dia que se vão e vem. Súbito, tudo tinha significado, e um amor tão quente como jamais sentiu. Girando Sempre no seu coração, que agora sentia disparar mais. Pensou então numa marcha , para conhecer outros como ele.

Uma marcha para ir contra o inimigo que agora era mesmo de muitos, como ele. O inimigo da solidão. Pensou , num amor tão grande, num ímpeto tão singelo: marcha contra a solidão, marcha dos solitários que querem, de alguma forma amar.

E mal conseguia se dormir na noite. Já se via marchando. Pronto, deixei o coitado do Agildo inquieto. Mimo besta meu, mas vamos ver no que se vai.

Perdi o controle de Agildo.

Acho que porque lhe dei um nome... Que coisa!

quinta-feira, 29 de maio de 2008

Dia de trabalho ( Ritual Matinal)

E lá vai o dia começando! Naquele cedo de labutar .

A canção estridente, desconcertantemente sonora, sacode os lençóis e puxa a cama , com profundos sentimentos urbanos, vindos de lábios ou de silício(s e eletrônico) ou metálicos (se mecânico), que chamam para um ânimo morno ou quente, já que depende se opção de ter visto aquele “filmimnho” legal de distrair , esticando a noite por mais uma ou duas horas.

E pelas notas estridentes da canção sem sentido , de tamanha pureza urbana, os pés pulam cama à fora , buscando sedenta uma solução para desinfetar o mal hálito da língua que vibra entre os dentes as primeiras palavras apressadas do dia que se dirigem ao relógio ou a falta de folga (pode se chamar preguiça também!).

Assim parte do sono , uma pequena porcentagem, vai por água fria e ralo à baixo, na borbulhante corrente do sabão, que indiferente , continua fazendo bolhas coloridas e flutuantes ignorando a pressa, diluindo-a no chão da água.

Murmurando então a chaleira fervente, a toalha estala pelo corpo preparando-o para o sagrado ritual de vestir as roupas já passadas, enquanto a toalha grita que o relógio vai embora sem dó nem piedade. Roupa estendida, quase lisa, eo café que se vai saindo numa mesa ligeira, para alguns aguado, outros apressado e abastecedor. Porém outros tantos so vai noutro parágrafo, pois é pelo caminho, tem café que só se embala na rua, não dá tempo de casa.

Amenizando a pressa, um calçado, tênis ou sapato, sorri um sorriso largo e matinal ,que em resposta vai-lhe um pé , com meia recém colocada, completando o sorriso , e já chamando para o trabalho. A camisa vai num abraço envolvente, banhada de desodorante e perfume a gosto. Camisas não gostam de abraçar ninguém sem esses detalhes, confessou-me uma outro dia desses . Chave na mão carteira e bolsa penduradas e guardadas em algum lugar, catam também a porta lhe expulsando de casa , de chofre, para mais um dia.

E lá se vão os pés... calçados e sorridentes, que pela pressa deslizam no bocejo de um que se corre no compasso do horário , e nem sempre certo, do coletivo certamente cheio.

Corre Pezinho, olha a hora! Não riam de bobo nem você nem o sapato!

domingo, 11 de maio de 2008

Exercício de Imaginar II

Exercício de Imaginar II

Já andei delirando nesse domingo. Me perdoem o desleixo.

v John Lee Hooker - I'll Never Get Out of These Blues Alive – 6 :21

Fazia um frio de rachar ,e seu casaco não cobria nem o buraco gelado que sentia chegar pelo ar frio da noite. A noite foi boa, e ficou ali na calçada de pé, esperando alguma condução, enquanto lembrava do beijo dela lhe saltando a mente. Pele macia, morena, com cabelos pretos e cacheados de um dia atrás de um balcão lhe caindo pelos ombros, bem desenhados sobre uma pele de pêssego. Suas mãos simples de servente percorrendo-lhe o corpo. Fora uma paixão súbita. Não conseguia ainda entender bem o que acontecia.

Esqueceu jaqueta esquecida e frio apertando. Lembrou do café quente que tomara depois do beijo enlouquecido e arrebatador, que os levou de uma vez, feito um soco, para as cobertas. Chovera o dia quase todo, e agora levantava um vapor frio do chão. O céu estrelava algumas coisas em sua mente. Lembrou do ia que se conheceram. Mas foi uma lembrança rápida, eu não lhes consigo descrever em tempo.

Seu tênis barato lhe denunciava a diferença de idade, e ele como mais novo. Ela desquitada, sem filhos, e o cara havia sumido no mundo. Lembrar de como se vestia para servir café naquela doceria lhe dava arrepios. E a saia verde delineada pelas suas pernas lhe chamava para um afago mais palpável.

Fora a primeira em muitos sentidos. A primeira de um rapaz que não chegou nem na metade da juventude, com uma carreira brilhante de físico nuclear pela frente. Ficou ali esperando um taxi, ou algo assim, e se vendo que não deixaria aquele caso explosivo da mesma forma que veio.

O boné se apertou mais em sua cabeça de cabelos cortados bem rente. Mas não escondia seu queixo largo que se projetava para a friagem a dentro, muito menos a parca barba que lhe denotava a pouca idade, pouco menos de 24, pouca experiência, pouca sensação de tudo. Na camisa listrada o perfume dela infundido com a lembrança de suas unhas, ameaçadoras, correndo pelo seu dorso novo, novinho cheio espinhas e de dias para não se contar.

E casaria? Não casar não... Mas e esse amor? Melhor nem pensar nisso. A noite chega alta, precisa voltar. Amanhã aula e também do dia de trabalho. Um taxi.

A porta se abre com um som diferente da porta dela, parecido com seus ditos e “estremidos” que vivenciou em poucos minutos. Sentou no banco do taxi, que parecia dizer ao taxista o seu destino junto com o peso.

Era perto.

Abriu sua porta tendo a impressão de que a ouvia na cozinha de seu minúsculo apartamento. Acendeu a luz na impressão imensa de sono. Tirou sua roupa fria e lenta, no acender das luzes. Sentou na cama de cuecas, se imaginando casar. Puxou o cobertor na obrigação da próxima manhã. Roncou de prazer numa respiração folgada e desleixada.

E não se cabe dizer do que se sonha. Isso é pessoal.

domingo, 27 de abril de 2008

Descrição III ( É rindo que se escreve e des-creve )

A praça é estranha e as árvores escuras, retocadas por fumaças de odores duvidosos e amaços fortuitos na sombra das mãos que se vão por folhas secas, que apodrecem na brisa fresca e noturna , num domingo findo de outono.

Cansado, um entregador exausto se entrega a uma pestana lisa e rápida. E entre o cansaço e o sono, seus olhos se entreabrem, enquanto o ouvido coça extremamente incomodo.

Um boçal falador elogia uma atriz de peso em seu programa de cadente, numa mentira laudatória, em louvor aos mil vazios de sua emissora besta. Seguido de aplausos intensos de quem entende patavinas do que ouve, mas o faz ao comando de sua voz pastosa e abobada, regada por ditos gastos pelo tempo

Ao fundo uma dupla escorre de bicicleta indo para qualquer lugar, com bonés xadrez a combinar, um levando o outros, de azul e branco.

Uma senhora num carro “pop” espera em tédio profundo suas batatas fritas que caminham ma bandeja pelos pés de alguém, lento e prestativo.

Casal não muito efusivo reclama da lata de refresco de cola , num romance enlatado e barato: ela , moça com cabelo descolorido, seios grandes, perfume barato e “micríssimo” jeans em bermuda (ou cinto). O boné é preto ,e virado para trás, numa atitude infantil e comum, duma marca ignorável e cara.

Tentei, num esforço hercúleo, ver o vídeo dito cômico, mas a frase sem graça e sem bossa do apresentador boçal expulsa minha minha parca atenção. Frase sem graça e arrastada, um insulto a minha graça...

Quatro numa mesa. Casais. Sabe-se lá o brinquedo frito, com molho, que pedem para comer.

E num gesto “holofótico” todos olham para a minha caneta que dança entre os meus dedos ao compasso das linhas, enquanto meu sorvete derrete gelando minha língua , que por dentro se ri disso tudo.

Vem mais uma dupla ciclística cruzando a rua, assim: num átimo. Dois, o de mochila vai na garupa.

O sódio derrete uma luz amarela, pelas folhas de uma amendoeira comprida feito guarda-sol fino. Mais a direita e ao fundo uma outra amendoeira se espreguiça pequena e estática, olhando os parcos carros que circulam. Mesas de metais e capas sintéticas se alimentam dos sons de uma televisão próxima.

A grade da estação, de pé branco e dorso azul, olha para frente e para trás , guardando a estação e fuxicando silenciosa da praça e seus conviveres para as árvores-que–não-sei-o-nome, numa conversa longa tediosa e supostamente divertida (no que diz a minha imaginação). Mas ninguém escuta, para sorte delas.

Crianças fogem de suas mesas ao som de suas mães , numa calçada regada de papel e guimbas de cigarros já frias.

Casais diversos se esfregam num dormente verde-ferroso, com uma dança estranha e buliçosa ao som dos beijos e das sombras dos postes sem luz sódica.

Meretrizes devidamente “desvestidas” soçorbram sassaricantes numa esquina ignorável , enquanto sorriem e brilham fedorentas e olorosas de perfume barato e rasgado, esperando mais um carro para engolirem o motorista e o seu dinheiro-de-tolo , tão suado e mal usado.

Ao som de luzes brancas e fluorescentes, quatro anciões bêbados de cigarro, cigarram e jogam cartas iluminando reclamações mil numa voz apagada pela praça

Abobalhados e vazios de assunto balançam suas mãos para o alto , aos som de um conjunto de barulhos com uma voz que berra indecências nas entrelinhas, mas que todo mundo sabe. Ao longe idiotas urinam num muro com cigarro na boca, e se olhando, falando de alguma moça caridosa que lhes deu alguma coisa.

quarta-feira, 23 de abril de 2008

Zumbido Etéreo

*Me desculpem pelo sumiço. tive um feriado bem agitado, de sorte que tive apenas esses dias restantes para arrumar a bagunça dos afazeres. Peço perdão, pois gosto dos blogs que costumo sempre visitar. Não o fiz ainda por falta de tempo. Mas espero muito fazê-lo. Obrigadíssimo a todos! O apoio de vocês me mantém escrevendo*

Tempo em trânsito. Rodas em fúria escavam lentamente o asfalto já gasto e mal-tratado da avenida radial. Hora de fúria, no cansaço ao motor ruidoso sono e impaciência se misturam nos salões coletivos das máquinas “transportantes” de pessoas. A hora aperta , todos querem voltar , e uma cheia súbita de coletivos, caminhões e carros , tomam as pistas radiais, em busca dos seus cem-mil-destinos. Soma-se tudo e o inverso da fluidez acontece, pois carros e carrocerias não são fluídos, por isso a s estradas se enforcam de rodas e motores, um congestionamento, digno de um infarto.

Infarto fulminante. O Som desse grito é ensurdecedor: milhões de buzinas e motores , em uníssono absurdo, cantam sua canção urbana e caótica. Para desespero de uns; cansaço de todos. Como um zunido mortal, esta musica “asfaltíca” se espalha insulta os ouvidos mais cansados e desapercebidos. Nunca na história urbana, uma enchente de carros e carrocerias chegou à tamanha sinfonia escabrosa.

Etéreo insulto se torna, perturbando a alma dos seus viventes, que estridente vai rasgando naturalmente os céus e nuvens mais ingênuos.

A enchente motorizada e metálica ganhou voz etérea e absurda. E em resposta o sobrenatural há de dizer...

(E a sinfonia escaldante segue , em glorioso espanto e terror, se, se importar com o porvir)

Então desce em invisível cavalgadura, um súbito cinza-silêncio sobre a urbes , que sorrateiramente vai cobrindo a cidade em sua caótica harmonia sinfônica. O entalar ensurdecedor de fluxo de veículos é tomado de um pavor silencioso , num mortal “calamento” de tudo. E a sombra extraordinária vai cobrindo molécula por molécula, toda a orgulhosa sinfonia ás avessas, que de espantados vão deixando os “urbanos conviventes” estupefatos de pavor calado e surdo.

O silêncio do céu desce calado e impetuoso, como resposta ao absurda ao caótico orgulho dos motores num zumbido de pavor e castigo.

Zumbido etéreo: misterioso silêncio que calou homens, máquinas e motores , em suas orgulhosas carruagens urbanas cuspidoras de fumaça e gritos “rodantes” sobre o asfalto quente da tarde que se esvai em silêncio repentino.

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Fim de prosa ( Parte III.. e a expectativa.. será que acaba? Nem eu sei...)

Olha que prosa mais formidável e estranha foi a ultima que nosso amigo passou. “Doidivânia” se foi, e vem uma senhora bem elegante já na curva do banco ,para esperar um ônibus. De coincidência ou não , é o mesmo que ele vai pegar amanha pela manhã. Mas que no caso de Domingo já noitinha iniciando, demora, e parece que nem chega às vezes , de tão demorado!

E voltava com um copo grande de açaí-gelado-roxo de colher na língua e gosto na mão, vai passando aquela gana medonha de fumar. Ficou só um pouquinho, parece que está se acalmando. Por que será? Acreditem, leitores e leitoras, ele vai descobrir ...

E Ao sentar-se , todo sorvente e roxo-frio, encontrou simpática senhora, com um rosto gasto de anos e coisas diversas de adversidades. Blusa simples saia simples, bolsa assim: à combinar.

Olhou para o moço sorvente, ela muito sorridente, perguntou do ônibus. “Hi! Acabou de passar. Demora”. Perguntou se incomodava uma prosa. Disse ele, com gosto de roxo-frio na mão , que não. Aceitaram-se ambos, embora idade. A noite de domingo já vinha e estava lá. Ele sozinho ela esperando. E aqui vai mais uma alfinetada ao pobre entediado de açaí-gelado-roxo na mão.

Ela dizia, que ônibus já demorou mais. Ele atento, ouviu de tudo. De conduções que tinham, mas não tinham. Do bonde. Dos trilhos. “meu pai trabalhava no Rio. Em Santa Tereza” E ela pequena , adolescente. Amigas . Mil situações.

“Masentão” uma lágrima. Nosso moço, coitado (eu ruim, nem nome lhe dei; não quis , por capricho, maldade e rebeldia) , ficou sem saber e gelado feito seu açaí-pela-metade, parou e ouviu tudo.

Pois então ai vai : “ Mas nessa idade moço. Eu era nova, muito bonita. Mocinha. Meu pai entrou num desespero tão grande. Naquele tempo, 1960 e poucos, mulher já trabalhava. Minha mãe trabalhava de atendente numa loja de granfino. Mas um dia ela fugiu. Nunca mais eu soube da minha mãe. Fiquei anos , muito tempo de pois, procurando paradeiro dela. Meu pai foi se afundando mais. Tentou trabalhar. Até conseguiu por uns anos. Porém a cachaça chamou ele mais alto. Era só eu de filha. Depois eu fui trabalhar, como caixa num supermercado grande. Trabalhei por lá por uns 5 anos. Eu já cansada de cuidar do meu pai. Ele morrendo. Quis fugir.

Ai eu conheci o pai dos meus filhos. Ele tinha um carro bonito. Era filho de um dos donos daquele supermercado. Nós queríamos fugir dali. Então numa madrugada silenciosa, nós fugimos. Viemos para cá. Nos escondemos. Agente foi ficando junto, não conhecíamos ninguém.

Achei que tivesse apaixonada. Geração paz e amor... Nem casei, mas continuei trabalhando. Fiz doce, lavei, passei. Costurei muito para muitos. Vieram os filhos, nós até brigávamos. Mas não muito. Ele cismou de trocar de carro. Era com um motor no coração, parecia ser movido à gasolina.

E trabalhava por um carro. E comprou. Veio um tempo de aperto. Meu trabalho não dava. Falei com ele. Ele dizia que era assim, que só tinha isso para oferecer. Um dia eu me cansei. Falei para ele que naquela noite ele tinha apenas uma opção pegar o seu carrão e sair dali. pois quem pagava a casa era eu. E ele foi , eu nunca mais o vi. Minha prima , bem mais novinha. Cansada da minha tia, me achou e veio morar aqui. Ajudava-me com os dois, enquanto eu estudava e trabalhava . ME formei. Passei me concurso. Trabalhei criei filhos. Nunca mais vi o pai deles. Minha prima casou. Ajudei com os filhos dela.

Vivi.

Meu ônibus!”

E assim o ônibus veio. Aquela senhora e sua vida sofrida e linda passou. Nosso amigo ficou lá , olhos cheios d’água , sem saber o que mais sorver. Dizem que misericórdia é você se ver nos olhos do sue oponente, ver sua gana pro mal, como sue “oponente”.

Ouviu. Viu que também era egoísta. E entendeu porque sua gana de fumar passara e também do imenso-tédio-de-teto-alto que sentia ali.

Levantou. Jogou o açaí fora. Limpou os olhos.

Se vai haver continuação disso ou não não sei. O importante é que alguma coisa nele mudou. Fui cruel, reconheço.

Mas foi divertido

sexta-feira, 11 de abril de 2008

Uns alunos me deram este presente (turma 2001): família

-> Este post é fruto de uma aula que tive com meus alunos na última quinta feira.


Trazia entre os dedos um cigarro estranho com uma fumaça de matar. O bolso estava cheio de algo que parecia uma arma de tirar susto a qualquer um desentendido do assunto. E se ia pela rua como desnorteado, como bebido toda cachaça do mundo, ou alucinado como cheirado toda a cocaína do mundo ou um no vício da maconha.

A sensação era de doer. Sentia um torpor amargo na boca, devido a tristeza e angústia que passava naquele momento.

A madrugada se arrastava de ir embora, e o dia vinha chegando, sem licença ou bater de porta para entrar. Nem ao menos uma permissão, apenas vinha; e pronto.

Uma mentira chorava no seu coração. Não era possível. Como o galopar do dia se vinha, a falsidade achou sela e não parava. Veria de qualquer jeito. Mas sabia que não estava enganado. O amanha chegava, e a vontade era de parar com as brigas, de gritar com voz chorosa por dias mais amenos e mais pacíficos.

Ainda amava , e continuaria amando. Pois amar se aprende mesmo amando, praticando amor; abrindo mão daquilo que tanto se quer pela felicidade de outro. Mentiram traições e a desigualdade não passava. E por mais desigual que as coisas fossem, amaria.

Alta noite já passou, madrugada dança sua ultima canção. O dia vem com o céu púrpura, de promessas , raiando um sol de novidade estranha.

Era possível aceitar que tinha um pai vivo. E viu com os seus de semelhança e descrença que era realmente seu pai. No rosto uma lágrima que passa por um borrão de briga , pois não foi aceito pelo seu meio irmão. Brigaram na sala.

Continuaria amando? Que era esse sentimento pungente que lhe dominava o coração ferido, descrente e surpreso. Madrugada já fez seu baile e o dia chega. Pessoas já saem para seu trabalho.

Uma roda de aros de bicicleta lhe chama com alguém dono de uma voz conhecida e recente. Um rapaz , como ele, para, olhos inchados de chorar também. A ternura do choro minou aquela raiva repentina de algumas horas atrás.

- Sei que você não tem culpa de nada. Acho que começamos errados. Se vamos ser irmãos, vamos começar como uma família...

Manhã chega laboriosa. Propõe novos trabalhos para todos.

domingo, 6 de abril de 2008

Exercício de imaginar I

Eu costumo, devido a minha imaginação infantil e hiper-ativa, quando ouço algumas músicas, imaginar algumas cenas. Esse “post” aqui é fruto disso: imaginação pueril e fértil. Como eu gosto de umas músicas diferentes , peço que não estranhem as referências. Achei-as fácil na Internet. E se as quiserem, eu as passo. Eis as ultimas mini narrativas.


  • Mohamed Reza Shajarian – Night silence desert- Rain – 00:09:35

O Sol vai acompanhando a areia fina que levanta a cada passada esguia da montaria. Seu corpo na montaria vai balançando ao sabor do vento, com os seus olhos amarrados ao rosto pelo fino preço da seda azul que impede que o vento do deserto lhe “desertifique” a boca também. No corpo um tecido grosseiro, grosseiramente lavados, com resquício de manchas rubras de batalhas passadas,e na cintura, fina “prátea” lâmina, numa bainha de marfim e metal polido.

Suas façanhas enumeram-se por toda Pérsia e seu império. Pés ligeiros como o vento do deserto; lâmina "dançante" feito o vapor do deserto distorcendo a imagem ao longe. Um olhar sereno que esconde a fina dor de sangue alheio derramado. Saudade lancinante de uma vida comum banhada pela fama de exímio guerreiro. Dizem as toadas de grandes rimas chorosas que muitos já caíram,e de uma só vez, pelo rápido mover de sua lâmina, mas seu coração mesmo reclama da saudade e do vazio de sua esposa. Amor que não vingou há anos. Amor que o trouxe para o calor da batalha.

O dia se esvai qual areia em ampulheta,e a noite abraça o dia tornando o céu rúbreo de estrelas e a lua como um minarete, no alto do céu, já-vem surgindo. Seu corpo marcado de cortes e dores diversas, vai chegando aos portões da renomada cidade. Num gesto falado , de comunicação leal entre montaria e seu dono, ele desmonta, puxando com carinho pelas mãos , seu fiel amigo de jornada.

A noite vai caindo com o orvalho de saudades, de longe , uma canção antiga lhe lembra dias remotos, de paz que jamais voltarão. Desata o nó de fina seda do rosto, revelando um olhar cansado da viagem. Mais um dia se vai n deserto, e a vida continua sob o fio de sua renomada espada ligeira. Ligeira feito o vento que traz a areia.

  • The Shoes of Fisherman’s Wife and Son – Charles Mingus – 00:09:35

Um som “estalante” de firme calçado pisado contra o mármore do chão do magnífico prédio luxuoso, com características de “art-nouveau”, ecoava por todo o hall de entrada. Não chegava a exatamente chamar a atenção de todos , pois a correria era grande. Pessoas entrando e saindo, e malas indo para fora e para dentro das dependências do hotel com seus ajudantes de vermelho.

Ela chegou pisando forte e delicada em seus calçados prada, casaco discreto e rosto branco, fino de matar. Um olhar comum e paciente lhe cobria o rosto enquanto alguns homens lhe dirigiam uma rápida cobiça silenciosa. Vestido preto, com negros cabelos, caminham languidamente para o balcão de recepção do distinto e caro hotel, presente nas mais diversas narrativas deste gênero, recebia sua voz calma, sensual e baixa. Discretíssima, como sua bolsa preta de material puro.

Num gesto simples ela recebe a chave, dá um sinal da graça de sua beleza que se estadia naquele lugar. Agradece gentil e formal. Chama sua mala com um rapaz simples em vermelho. Toma um elevador.

O corredor branco se contrasta com seu discreto preto de roupa e seu caminhar feminino, de luxo, mas simples, sem chamar a atenção. Mala vem atrás, de vermelho, laconicamente. Uma porta indica a numeração desejada. Abre-a sem cerimônia, porém simples. O uniforme vermelho-lacônico, com chapéu circular feito lata de doce, recebe uma gorjeta , e o rapaz simples agradece.

Ele vai descendo o corredor de volta ao elevador, rápido para as próximas malas que hão de subir. A porta do elevador apita a chegada de mais um itinerário que desce. E o barulho das portas se abrindo é interrompido por um estampido rouco, rápido e rasgante. Um tiro, se assusta e corre, temendo pelo vestido preto no formato da bela moça que trouxe minutos atrás.

sábado, 5 de abril de 2008

“Doidivânia” – a mulher-veneta (incrível continuação parte II... mas sem missão)

E como relatava, Ela ficou ali falando, chorando, nem mesmo o nosso amigo entendia o que estava acontecendo ali. Continuava com o seu açaí, o copo estava chegando na metade. Ela sentou chorando. Ficou olhando para o nada chorando. Jurou uma vingança boba. Não podia deixá-la a pé naquele fim de mundo. Logo ela, tão bonita. E ficou ali se elogiando, elogiando como todos nos bailes da vida cobiçam sua beleza, de como dança bem, quantos já fez... Essas coisas.

Mas uma raiva tão tola, tão besta, tão sem sentido. E apertava o pulso dizia que nã oera mulher de andar de ônibus. Como ele faz isso com ela... E raiva para cá, e desamor para lá, e choro sentido. Limpa o nariz. Escorre maquiagem. Passa ônibus.

Açaí derrete. Nosso amigo olha de esguelha para moça. Moça chora, de ódio , de raiva, sanha de mulher fácil.

Olha.. Que vontade de acender uma fumacinha. Seria charmoso agora, ele pensa, um desdém de gesto contido. Se segura, vai parar de fumar e ponto. Mais uma colherada olhando para ela. Açaí ta acabando e derretendo. Até que a “cinto-em-cima-cinto-em-baixo” solta algo terrível e risível:

- Você me acha gostosa?

Ele levanta. Olha para ela com cara de não–sei-o-quê, joga o copo no lixo do ponto de ônibus, resmunga comparando ela como uma argola de ouro na orelha de um macaco: não tem sentido.

Só reparando na cara de sem graça que ela faz. Tenta ajeitar o que não se ajeita, pois os “cintos” parece que vão explodir no corpo da moça.

Pensou consigo o que a moça tinha de largada, tinha de nova. E na ânsia que buscar outro açaí para distraí a vontade de fumar , vai a passos preguiçosos resmungando:

- Como querer uma mulher que nem sabe o que é ser mulher?

Ele falou bonito. Eu penso isso, ele também. Como escritor dessa coisa toda tenho acesso a esse nível. E já saindo a moça diz:

- meu nome é Vânia

- Então moça é doidivânia, porque você é maluca! Onde já se viu falar com estranhos desse jeito...

E sai todo sorvente, querendo açaí para disfarçar a gana de cigarro. Queria voltar para casa, mas sozinho e sem moveis pioraria tudo. Procurou o bolso para mais um copo de açaí. “Etâ vontade besta! Vai passar...”

E voltou para o banco pedinte de limpeza do ponto de ônibus. Doidivânia foi doidivanar em outro lugar, em fim a sós de novo. Pedia uma fumacinha, pensou.

Mas quem disse que eu quero deixar esse sujeito em paz com seu recém-açaí, com vontade de fumar à queima roupa?

Pois só de implicância Vem uma senhora, muito bem arrumada, na casa dos 50. Saivá verde , camisa azul e bolsa discreta para combinar. São quase 17 horas e 30 minutos, a tarde ta indo.. e a Senhora vindo...

segunda-feira, 31 de março de 2008

Digressão no ponto de ônibus ou Narrativa sem sentido (acho que parte I)

Ficou ali um tempo, sentado no ponto de ônibus esperando que alguma coisa acontecesse. Sua casa estava vazia, e havia poucos móveis nela. O eco e a solidão eram de rachar a alma, pensava consigo. Como prometera para si mesmo de não tocar mais em nenhum cigarro, puxou do bolso uma bala de gengibre, que ardia feito "não sei o quê", mas na verdade nem sabia ao certo porque fazia aquilo , ou mesmo porque tentava manter a saúde de alguma forma, já que achava não fazer diferença para ninguém se estivesse vivo ou não.

E ao acabar o gosto ardido do gengibre e da bala, saiu e arranjou um sorvente açaí-roxo-do-mato.

Mais um ônibus, que ele normalmente pegaria, passou. Mas como não estava lá para esperar ônibus nenhum, nem se incomodou de levantar, só de raiva, pois quando precisa nunca passa na hora. E nossa! A vontade de riscar um fósforo era grande! Sorte não ter nenhum cigarro por ali. Sentado , se perguntava o que fazia parado feito um demente. Realmente estava sozinho naquele lugar. E ficou desse jeito: parado com vontade de fumar, pensando ser um biruta, demente ou algo do tipo, constatando que se de solidão chegara naquele ponto, foi porque ele mesmo quis.

Talvez se arrependesse. Talvez não. Mas como não sabia muito o que fazer naquele resto de domingo continuaria ali sentado, sorvendo, até que algo de fato não acontecesse.

Era o que ele achava. Afinal, pensou, tudo sempre foi um marasmo mesmo.

Mas, para quê eu escreveria estas linhas se algo não acontecesse certo? Afinal, narrativa só é narrativa se algo acontece...E esse sujeito ai paradão nesse banco de ponto de ônibus mal perde por esperar (no que depender dos meus dedos e das teclas). Porque afinal a vida é assim: quando agente pensa que tudo está em ordem ,ordenadamente confortável, pronto... É o suficiente para acontecer uma coisinha à toa assim, ô! E fica a nossa vida de cabeça para baixo. Vai dizer que não é assim?

Mas voltemos no ponto de ônibus: pois nosso amigo continuou lá, parado. Vontade de fumar única de angustia, roeria as unhas de desespero (pois quer porque quer parar) se não fosse o copo médio de açaí que sorvia à colherinha... Só para ver o tempo passar e derreter tudo em roxo-açaí-do-mato. E ficou lá sorvendo, pensando e ruminando “ vida simples a minha; gosto dela. E gasto nela também. Principalmente o tempo, e faço isso sem sentido”

E passou um outro ônibus, sentido central, dele brota uma figura delgada, morena, cabelos cacheados e olhos molhados de maquiagem recém borrada a lágrimas . Com sua roupa “cinto em cima e cinto em baixo” ela chora , sentando e se arrependendo em soluços ao lado de nosso apático sorvedor de açaí.

E como se ele fosse psicólogo, ou estas linhas alguma obra remota de relatos ela lhe conta um pouco sobre sua rápida história de amor físico no carro do seu rápido “ex”.

Aquilo que ela lhe falaria mudaria tudo. Talvez ele tivesse que comprar depois um outro açaí , se pretendesse ficar ali.

Até que ela começa a falar...(não disse que eu atazanaria alguma coisa! Te mete!?)

sexta-feira, 28 de março de 2008

A pressa e a poça: urbaníssimas cenas

Os passos transeuntes se arrastam de calçado em calçado; cada calçado com o seu pé, e cada pé vai com sua direção. Indiferente à pressa , a água suja e estagnada vibra ao sabor da brisa poluída, aguardando a ação do tempo para evaporar-se da poça suja aberta pelo chão, nas calçadas e asfaltos. Brisa de poluição passa leve , quente e suja, junto com a pressa que vai muito rápido, obrigado.

E passa mais uma vez. E mais um pé inadvertido perturba a paz que havia na superfície preta (ou marrom ou qualquer outra cor suja) que havia na água refém da poça.

Enquanto a querela não se resolve, a multidão de multi-pés corre solta, vai andando como rês de gado, para todo o lado e sem sentido, mas cada um com seu plano e destino pisoteando sem dó nem piedade o duro chão aberto de poças-de-chuva e maus-tratos de esquecimento anual.

Cada qual na sua direção, segue esbarrando em si a multidão na “calçádica” cela do relógio, que vai de polpa e vento anunciando os compromissos agendais, os destinos que gritam em suas mentes “aqui” “aqui”, comuns no meio urbaníssimo.

Pois urbana é a presa dos carros alisando o asfalto preto, já sofridos pelo descuido, como também os sem-número de pés que esgarçam lentamente as solas sintéticas que os revestem. Sem dó nem piedade.

E a pressa é quase santa, com auréola no formato de relógio.

De repente... Não mais que De repente... Bum! Chuva estrondando, o céu esvaindo de cinza, enquanto a água fria e inesperada goteja inflamando mais a fogueira da pressa citadina.

Logo, saias, calças e vestuários multiformes correm mais, com mais gana de pressa,e ai o passo aperta : êta chuva porquera!- Levantando às mãos para a chuva feito peneira para tapar o sol.

Se vem ela caindo, a chuva, escarafunchando o chão, abrindo valas e córregos imundos. Vêm a luz novas poças fedorentas (e algumas fétidas, e com louvor). E vai caindo a chuva ameaçando destruir, sem perdão ou escrúpulos, os permanentes alheios, encharcando calçados fechados e planando os sulcos emborrachados das rodas radiais por cima de si, enquanto ela tenta se acalmar depois da queda imensa .

Então,desesperada , a Chuva amortece a pressa do transito,e vai deixando os motoristas à flor do mal-humor, com ânsias de revolta , numa súbita febre de repulsa e palavras torpes dirigidas aos outros motoristas, como também ao pobre volante morto-preto-sintético.

Presas à parte, pequenas embalagens ,guimbas de cigarros abandonadas, outros lixinhos e dejetos leves vão escorregando fluxo abaixo, como crianças caem de felizes num escorrega, na correnteza de poluída que aprisionou a água da chuva. Mesmo com a pressa ao redor deles, brincam na água sem fazer cerimônia e desdenhando da gente.

domingo, 23 de março de 2008

Uma certeza para Percorrer (e achar... se você puder)

Eu começaria um conto, caso houvesse, com este título. E se eu o escrevesse, seria então uma certeza,e eu a percorreria se um caminho para tal surgisse.

Pois então perceba você a peculiaridade destas linhas... E se não estragasse a surpresa, eu mesmo a contaria!

Seria ótimo então que a vida me proporcionasse condições melhores e assim o produziria satisfeito, com o lápis e o teclado na mão.

Seria um conto cheio de fábulas e maravilhas, como se alguém caminhasse de frente ao perigo, ou ao desconhecido. E muitos degustariam cada palavra: como se comessem algo suculento.

Faiscaria, e como as palavras se remontassem por si só, coisas novas e inesperadas existiram. E grandes blocos, se tais palavras imaginativas surgissem, cairiam ou flutuariam, dourados, muito-cor ou furta-cor, como se um trovão, de súbito “alumbramento” ou descobrimento, ressoasse diretamente na sua imaginação leitor!

Simples assim, rápido assim, como o súbito som de estalar de dedos (ou de palavras).

E para o número final destas linhas “percorrentes”, se você , meu caro ,minha cara, percebesse a incrível jogada destas palavras com o título, Como você riria?

Se caso riso ou súbito estranhamento lhe permitisse você responderia?

“Ser-me-ia” algo especial; compartilhar talvez...

quarta-feira, 19 de março de 2008

“Bunitinho”

Palavras caem do céu, e suas letras escorrem como a chuva numa noite estrelada e solitária. Elas pulam no ar, brincam de sons , enquanto nada são, apenas significado puro, pueril e ingênuo. Despretensiosas, esse é o adjetivo ideal (e já não seria mais uma palavra brincando comigo... que surpresa!). E ficam assim, brincando enquanto esperam a forma de um significado maior de um texto ou um contexto. Qualquer um destes serve.

Na chuva solitária de noite estrelada e céu límpido as palavras simples, aladas e divertidas vêm a mim para iniciarmos um jogo só nosso , onde o mais importante é divertir-nos e nada mais.

Mas divertir-nos de tal forma que passaríamos de praça na sexta a noite à guarda chuva naquela chuvinha chata de quarta feira às cinco horas da tarde.

Mesmo assim, mesmo brincando, poderíamos até brigar. E brigar de tal forma, e tão feio, que elas se esconderiam de mim. Só de birra. Só de raiva

E assim eu ficando já louco... louco então para continuar a brincadeira até a chuva parar e sono vir, junto com a lua que já está alta no céu.

E mesmo dormindo , elas escorregam para os meus sonhos noturnos, e me assobiando novas aventuras, continuo assim essa brincadeira com as palavras.

terça-feira, 18 de março de 2008

18/03 – Descrição II (repensar e recuperar)

Mundo gira em torno de um ar enfraquecido, e seco que o dia me proporciona. O dia gira, fica seco. Levanto-me fracamente enquanto a porta lá fora é aberta por uma voz amiga que num gesto simples, mas de profundo carinho, traz coisas ao socorre de um intestino irritado.

Faz-me um pouco de companhia, e depois volta. Pois a vida segue e um dia na vida de quem está doente é assim mesmo.

Enquanto isso me exaspero por dentro : queria estar no trabalho, interagindo conversando.

Logo minha companhia vai embora e eu sabia que passaria o restante das horas do dia sozinho. Ou na companhia de minha bíblia, ou de um joguinho, ou de "Senhora". Mas Deus sempre fica ao meu lado

É tempo de repensar minha "solteirice". Estava confortável , e até prazeroso. Mas de repente começou a pesar. A bem da verdade, é que as coisas já não são tão jovens quando se esta à beira dos 29 anos. Já me preocupei muito com a idade, casamento, filhos (apesar de sempre, no fundo desejar construir uma família) e uma esposa.

Dia de sol, dor de cabeça e uma lista restritíssima de alimentos que se podem comer.

Enquanto isso eu curto um tedioso dia em casa. Não gosto de ficar em casa de molho. Me irrita: não quero mais ficar sozinho.

Doente então nem se fale!

Mas o dia acaba a noite chega, outra visita vem. Melhora um pouco. Devagar

Preciso repensar minha vida, pois está pesada, tal como a dor de cabeça que vai passando , devido ao remédio, ou a noite que vai chegando cálida.

Passei o dia em casa, suando e doente.

O dia valeu a pena por escrever.

Valeu mais a pena por repensar minha vida.

Declaro publicamente que aceito passar para o outro estágio da vida de um homem: construir um lar.

Digno... De preferência...

domingo, 16 de março de 2008

Descrições I ( a praça domingo a noite)

A tolice do ar condensava-se com a chuva que estava para cair estranha, como a voz rouca de um homem embriagado que cantava um sucesso dos anos oitenta num microfone próximo. E o barulho das molas rangendo no pula-pula barato onde algumas crianças brincam vai se juntando ao som de alguns adultos que conversam algo, e sempre sobre vida sentimental mal resolvida.

E o som confuso de um casal que discute e musicas furiosas e sem sentindo infundiam mais o ar débil daquela praça de domingo a noite. Homens, aos bandos ou de carro, gritam gracinhas obscenas aos trajes semi-nús das jovens que também em grupos, andam sem rumo sorrindo em sem sentido, estampando um batom barato de mais um domingo de festa . Uma festa sem um motivo real para comemorar. Uma festa de idiotas. Uma noite de tolos. E risos rápidos e baratos circulavam no ar junto com a fumaça de cigarros e carros, formando um turbilhão sem-sentido com a volúpia dos corpos que se abrasavam o ar.

Tudo era idiota, ingênuo, promíscuo, algumas vezes, indigesto e destrutivamente consumidor. E como gafanhotos que se acometem sobre plantas, pessoas se amontoam em praças , bares e karaokês para consumirem bebida, comida, ar e uns ao outros, sem se importar com o dia de amanha.

Amanhã é amanhã.

O amanhã não existe; o amanhã começa hoje... agora.. .aqui.

Testemunha de desaparecer

Mãos rápidas. Precisas. A palavra já lhe trazia certa cada tecla para o registro de cada letra ou sinal pensado. E assim um raio passava de uma tecla para outra. Num átimo. Um dos mais rápidos num raio de trezentos quilômetros; testemunhado por funcionários de grandes empresas internacionais.

Sua vida ritmava ao som das palhetas estalando palavras ao papel, das batidas dos dedos nas teclas suavizadas ou pela troca de papel , ou pela troca da fita. Datilografar era a sua vida e o que mais amava. Pelas suas contas, ja deveria ter dado três voltas ao mundo datilografando. naquela época seus pensamentos se tornaram céleres como seus dedos.

Datilografar era a sua vida e o motivo de ter se tornado alguém, dentre os muitos deste mundo. Era o que lhe tornava a vida especial.

Como então olhar para si mesmo sem máquinas de escrever, sem aquela aparelhagem que lhe era tão cara, tão viva?

De muito não datilografava mais. Sentia-se desaparecer. E lhe era verdade. Cada suspiro demonstrava isso.

Em algumas horas desapareceria, junto com sua amada que desaparecera há anos.

Nos últimos momentos de vidas os humanos retornam às mais antigas tramas de suas memórias. E este aqui que está prestes a desaparecer não é exceção.

Seu trabalho, e o orgulho que lhe trazia, fazem parte deste caminho da memória, que como um fio vai "re-tecendo" sua trama. Lembra de lugares, nomes, pessoas. Suas mãos se responsabilizavam por documentos importantes, relatos e avisos; seu trabalho, apesar de extinto, era digno e respeitado. Pude ouvi-lo dizer: “eram dias dourados e gloriosos".

De certa forma, a palavra fazia parte do incrível conjunto de engrenagens que faziam o texto se movimentar. Uma vez percebera que a palavra era a engrenagem principal de todo o conjunto.

Um dia, inclusive, desejou ser um melhor usuário e conhecedor das letras. Nestes momentos finais se arrepende de não ter levado adiante esta empresa, pois hoje, teria de alguma forma , melhor registrado aquele tempo áureo que a humanidade passou muito rápido e não o digeriu.

Talvez, se conhecesse melhor as palavras poderia ter expressado melhor, junto com sua amada e seu incrível conjunto de engrenagens, as coisas simples que lhe conferia o prazer da datilografia. o acalanto do barulho da datilografia, o som do papel saindo, pronto "falando" o que deveria dizer, poderia ter contado aos outros como lhes eram caras estas impressões.

Lembranças que não se sentiu competente para registrar, e agora desaparecerão junto com ele.

Apenas eu, um límpido copo d’água, junto à cômoda da cama, tenho comigo seus últimos momentos, gravados numa superfície antiga de água, fácil de ler. Dito para que um outro as registre, e você leia.

A hora de juntar-se a sua profissão amada estava chegando, e começando pelas suas lágrimas , o desaparecimento iniciou. tentou buscar-me na sua cômoda, mas suas mãos já não eram: estavam transparentes, e a tristeza terminou de lhe inundar o coração. Queixou-se de não sentir mais as suas pernas, num tom rouco e choroso. Suas mãos rápidas e antigas de histórias para contar já não existiam mais. Pude ouvir , muito baixou e rouco, uma palavra de agradecimento a Deus.

Foi então que percebi que suas cobertas jaziam vazias pela cama velha e macia.

E tomado pelo nada que definia sua profissão nos dias de hoje, desaparecia assim o mais rápido e anônimo datilografo que o mundo já conhecera.